Estamos trilhando um caminho perigoso para uma nova leva de dependentes do álcool

O consumo de vinho deu um salto durante a pandemia: consequências para o estômago e o fígado. Pixabay/Reprodução

 

À medida que os meses vão passando, as consequências do isolamento social rigoroso imposto à população vão aparecendo. Há algumas semanas, a Sociedade Brasileira de Cardiologia alertou que as mortes em casa por problemas cardíacos aumentaram 30%. Segundo a Fiocruz, o número de óbitos em residências por causas naturais cresceu 53% em quatro capitais do Brasil – Rio, São Paulo, Manaus e Fortaleza. Por medo da Covid-19, as pessoas simplesmente pararam de procurar ajuda para seus problemas crônicos, um efeito colateral grave à panaceia criada pelo coronavirus. Por medo de uma doença, morreu-se de outra.

Agora, outra consequência começa a ser percebida na sociedade: é cada vez maior o número de pessoas que assumem estar consumindo mais bebida alcoólica do que antes da pandemia. Dados da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (Abead) apontam um crescimento de 38% nas vendas de bebidas alcoólicas nas distribuidoras desde o início do isolamento social. Nos mercados, o aumento nas vendas foi de 27%. Ainda segundo a Fiocruz, 18% dos brasileiros aumentaram o consumo de álcool nesse período. O índice foi ainda maior (26%) na faixa etária de 30 a 39 anos. Conclusão: estamos trilhando um caminho perigoso para uma nova leva de dependentes do álcool.

Ao contrário dos hormônios do estresse, que estimulam o sistema nervoso, a bebida alcoólica relaxa por ser um vasodilatador. Ela provoca um efeito imediato de prazer e agradável compensação. Mas seu consumo excessivo pode agravar os sintomas de ansiedade e depressão e gerar doenças gástricas e hepáticas.

Além disso, é importante atentar para a qualidade do sono. Quem bebe dorme mal: não gera repouso, emite roncos, produz estresse e todas as suas consequências. O que pouca gente sabe é que o consumo de bebida alcoólica em excesso enfraquece o sistema imunológico, aumentando a suscetibilidade do organismo à infecções.

A Organização Mundial de Saúde recomenda o consumo de 30 gramas de álcool por dia (ou seja, o equivalente a duas latas de cerveja ou duas taças de vinho ou uma dose de uísque). Vale lembrar que estas são referências a serem acompanhadas de um estilo de vida saudável, com alimentação balanceada e prática de exercícios.

No Brasil, pelo menos 10% da população é dependente de álcool, 20% relatam uso abusivo da substância, 60% dizem usar a bebida socialmente e 10% são abstêmios, segundo pesquisas. São números bastante elevados e que, infelizmente, tendem a crescer com o consumo desmedido de bebidas alcoólicas no Brasil durante a pandemia.

Gilberto Ururahy é médico há 40 anos, com longa atuação em Medicina Preventiva. É diretor da MedRio Check-up, líder brasileira em check-up médico. É detentor da Medalha da Academia Nacional de Medicina da França e autor de três livros: “Como se tornar um bom estressado” (Editora Salamandra), “O cérebro emocional” (Editora Rocco) e “Emoções e saúde” (Editora Rocco).