O medo da Covid-19 afastou os pacientes das consultas médicas. Envato Elements/Reprodução
Quem lançou o alerta foi o jornal americano The New York Times, na edição do último dia 22: “O que acontece quando as pessoas param de ir ao médico?”. A matéria investiga as consequências dos meses de isolamento social, quando muitos pacientes precisaram de acompanhamento médico para outras doenças que não a Covid-19 mas que, por receio de contaminação, ficaram em casa.
Com menos de 1% da população mundial vacinada, a pandemia ainda está longe de ser considerada sob controle. No entanto, é urgente dar atenção às outras doenças – como diabetes, câncer, doenças pulmonares e cardíacas – que exigem supervisão e orientação especializadas. Com muitas pessoas ainda receosas de retomar uma rotina mínima, que obedeça os protocolos sanitários de segurança, desenha-se o que o jornal americano definiu como uma “uma segunda pandemia de doenças não diagnosticadas ou não tratadas” desde março de 2020.
Segundo estudo publicado no Journal of the National Medical Association, em dezembro, 43% dos americanos não compareceram a consultas preventivas desde o inicio da pandemia. Nos primeiros três meses de isolamento, exames para detecção de câncer de mama, cólon e cervical caíram em 66%. As consequências dessa imprudência começam a aparecer: estudos apontam que, apenas nos primeiros seis meses de 2020, a expectativa de vida dos americanos caiu em um ano. Trata-se de um indício claro que mais pessoas estão morrendo por outras causas que não a Covid-19.
No Brasil não foi diferente. Em dezembro, a Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro divulgou que de abril a setembro ocorreram cerca de 27 mil óbitos acima do esperado — com base em anos anteriores —, a metade causados diretamente pela Covid-19. Outras mil pessoas morreram dentro de domicílios, ou seja, fora de qualquer hospital ou outra unidade de saúde e, provavelmente, sem assistência médica. Os dados apontam que, de março a setembro de 2020, houve 1,8 mil mortes classificadas com “causas mal definidas”, sem diagnóstico, outro possível indicador de desassistência médica.
Além disso, várias doenças aparecem entre os óbitos em excesso que não foram classificados como Covid-19. São diversas formas de câncer (2.500 óbitos), doenças endócrinas nutricionais e metabólicas, entre as quais se incluem as diabetes (mil óbitos) e as doenças do aparelho circulatório, infartos e AVCs, principalmente (3.800 óbitos). Todas essas mortes em excesso podem ter sido causadas por falta de atendimento adequado e oportuno.
Com o passar dos meses, aprendemos a lidar com a Covid-19. Sabemos seus riscos de infecção, os agravantes, os cuidados com higiene que fazem a diferença. Médicos e enfermeiros tiveram tempo de conhecer a doença com mais profundidade. Agora, então, é hora de promover saúde. Mais que nunca urge que a população procure seus médicos e fortaleça a saúde. Saúde é prevenção!
Gilberto Ururahy é médico há 40 anos, com longa atuação em Medicina Preventiva. É diretor da MedRio Check-up, líder brasileira em check-up médico. É detentor da Medalha da Academia Nacional de Medicina da França e autor de três livros: “Como se tornar um bom estressado” (Editora Salamandra), “O cérebro emocional” (Editora Rocco) e “Emoções e saúde” (Editora Rocco).